Alm. das Artes e Letras1875
Alb.dosVenc.13
" ... Foi pai da poetisa Branca de Gonta Colaço e avô do escritor Tomás Ribeiro Colaço.
Já era deputado quando publicou em 1862 a obra D. Jaime ou a dominação de Castela, e que a tinha escrito, em verso, quando estava no Brasil e antes do exílio do imperador D. Pedro II com sua família para o Reino de Portugal a quem dirigia.[3] Antecipadamente enaltecia a pátria que depois veio a acolher o monarca, fazendo-lhe recordar a sua grandiosa história comum e a beleza que lá iria encontrar, com a célebre frase "Jardim da Europa à beira-mar plantado”. ... " (ler+)
"A Portugal"
Meu Portugal, meu berço de inocente,
Lisa estrada que andei débil infante,
Variado jardim de adolescente,
Meu laranjal em flor sempre odorante,
Minha tarde de amor, meu dia ardente,
Minha noite de estrelas rutilante,
Meu vergado pomar de um rico Outono,
Sê meu berço final no último sono!
Costumei-me a saber os teus segredos
Desde que soube amar; e amei-os tanto!
Sonhava as noites de teus dias ledos
Afogado de enlevo, em riso e em pranto.
Quis dar-te hinos de amor, débeis os dedos
Não sabiam soltar da lira o canto,
Mas amar-te o esplendor de imenso brilho ...
Eu tinha coração, e era teu filho!
Jardim da Europa à beira-mar plantado
De louros e de acácias olorosas;
De fontes e de arroios serpeado,
Rasgado por torrentes alterosas;
Onde num cerro erguido e requeimado
Se casam em festões jasmins e rosas;
Balsa virente de eternal magia
Onde as aves gorjeiam noite e dia.
O que te desdenhar mente sem brio
Ou nunca viu teus prados e teus montes;
Ou nunca, ao pôr do sol de ameno Estio,
Viu franjas de ouro e rosa os horizontes,
Ondas de azul e prata em cada rio,
As perlas e os rubis de tuas fontes;
em de teus anjos, "térreo paraíso,
Sentiu o magnetismo num sorriso.
Pátria! filha do sol das Primaveras,
Rica dona de messes e pomares,
Recorda ao mundo ingrato as priscas eras
Em que tu lhe ensinaste a erguer altares!
Mostra-lhe os esqueletos das galeras
Que foram descobrir mundos e mares.
Se alguém menosprezar teu manto pobre,
Ri-te do fátuo, que se julga nobre!
Por que te miras triste sobre as águas,
Pobre ... de aquém e de além-mar senhora?
E te consomes nas candentes fráguas
Das saudades cruéis que tens de outrora?
Por tantos louros que te deram? Mágoas?
Foste mal paga e mal julgada? Embora!
Hás-de cingir o teu diadema augusto;
São teus filhos leais e Deus é justo!
Três testemunhas tens que ao mundo, inteiro,
Grandes, hão-de levar-te a ingente glória: ~
Camões, o sol, o oceano; que o primeiro
Ergueu-te em alto canto a nobre história.
Com prantos e com sangue, audaz guerreiro,
O teu livro escreveu de alta memória!
Lede os cantos divinos do poeta,
Entoados em harpa de profeta!
O mar, na eterna lida porfiosa,
Cansado de correr largos desvios,
Vem afogar a sede angustiosa _
N o saboroso néctar de teus rios.
E quando, rioutra idade mais ditosa,
Tu mandaste alongar teus senhorios,
Conhecendo o roçar das tuas sondas,
Cavou as penhas e aplanou as ondas,
Bramir ouviste o génio das tormentas,
Algoz de tanto nauta aventureiro;
Vestido de nublinas pardacentas,
Aspirando golfadas de aguaceiro;
Mas quando viu, nas quilhas tão atentas,
Içado o teu pendão, tão altaneiro,
Acendendo o Santelmo resplendente
Iluminou-te as portas do Oriente!
Fiel, sempre fiel à tua glória,
Conduziu-te o Evangelho a longes terras;
Acompanhou-te os cantos da vitória,
Saudou-te os brios nas longínquas guerras!
Rasguem embora, ó pátria, a tua história, _
Enquanto o mar bramir, quebrando serras,
Ou brincar nas areias, em bonança,
Hão-de· falar de ti, pátria, descansa.
Qual no deserto o lasso viandante
Vai no oásis sentar-se ao fim do dia,
Achando, extenuado e arquejante,
Verdor, fontes, aromas e harmonia,
E naquela atmosfera inebriante
Se alimenta, se farta, se extasia,
Tu és do s01 oásis reservado,
Jardim da Europa à beira-mar plantado.
Aqui apura os raios de luz viva
Nos bosques, nos rosais e nas campinas;
De um íris c'roa a nuvem mais esquiva,
Nem tem c'roa real pedras mais finas;
Faz prismas cada fonte que deriva
Por encosta suave entre boninas;
Dá luz dourada à selva que verdeja:
E o sol de Portugal o mundo o inveja.
Mas não é de hoje só que o passageiro
Te vê ledo banhar em cada fonte,
Ou entre a branda relva do valeiro,
Ou sobre as neves do jaspeado monte;
Já não é de hoje só que o mundo inteiro
Fala do brilho teu neste horizonte;
Já Celtiberos, Mouros e Romanos
Choraram pelo sol dos Lusitanos.
Lua do meu país, não me esqueceste,
Que eu sempre soube amar tua lindeza;
Bem sei que é este o sólio que escolheste,
Bem sei que tens aqui maior pureza;
Mas tanto os meus segredos entendeste,
Era tão minha só tua tristeza,
Que se não te invoquei, saudosa lua,
Foi por zelos da terra, minha ... e tua!
Por ti canto, meu berço de inocente,
Lisa estrada que andei débil infante;
Meu viçoso jardim de adolescente,
Meu laranjal em flor sempre odorante,
Minha tarde de amor, meu dia ardente,
Minha noite de estrelas rutilante,
Tu ... dá-me ao cerrar noite o meu Inverno,
Um leito funeral ao sono eterno.
Autor: Thomaz Ribeiro (1831-1901)
Rev.Mun.40
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